Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade
Presbiteriana Mackenzie e doutora em Comunicação e
Semiótica pela PUC-SP.
Entrevista:
1 Em sala de aula, as histórias servem como
ferramenta de aprendizagem. Existe alguma
maneira pela qual ela pode ser mais bem explorada?
As histórias dão contexto às diversas situações que
enfrentamos na vida, algumas delas difíceis de serem
explicadas de forma isolada, por isso as histórias são
importantes principalmente para as questões emocionais
e comportamentais. Além da reflexão sobre o conteúdo
que as histórias proporcionam, elas trabalham com o
raciocínio, à medida que a criança acompanha a sucessão
de fatos; com a imaginação, à medida que ela desenha
cenários na sua mente; senso crítico, à medida que faz
seus próprios julgamentos dos acontecimentos; e,
como consequência, desenvolve a criatividade pela
quantidade de referências que acumula. Para potencializar
esses efeitos, podemos usar recursos que possam
trabalham mais a história, por exemplo: depois de
contada, as crianças podem fazer um desenho livre sobre
a história, pode ser uma passagem, pode ser um
personagem, isso fará com que elas elaborem os conceitos
apreendidos, permitindo uma maior absorção. Em seguida,
pode-se fazer uma exposição de todos os desenhos, isso
fará com que as crianças percebam outras formas de se
ver a história. Esses trabalhos tão simples são de grande
valia para o desenvolvimento da criança. Na história de
Cinderela, a fada se atrasou e a moça ficou sem seu lindo
vestido, mas foi da mesma forma ao baile; como será que
ela fez? Enfim, existem muitas formas: pedir que façam
uma apresentação com fantoches, por exemplo, como
também diversos jogos que permitam essa expansão do
momento mágico da contação da história.
2 “Contar histórias” funciona apenas com crianças?
Funciona para todas as idades. Na verdade vivemos
contando histórias para exemplificar aquilo que desejamos
dizer, um fato passado, um testemunho de uma situação
análoga acontecida com um conhecido ou com uma pessoa
pública. Hoje a propaganda comercial fala muito em
“storytelling”, que vem a ser o quê? O produto e a marca
envolvem os seus possíveis consumidores com uma história
de amor, de heroísmo, de superação. E o que é o cinema,
a televisão, o teatro, se não criar uma situação de
envolvimento, se possível, arrebatador, com os seus
receptores. Mas se formos falar da situação formal de
contar uma história, da mesma forma que utilizamos com
crianças, também é possível, escolhendo-se uma história
que seja adequada à compreensão do adulto e, é claro,
usando-se das técnicas habituais do contador: cadência
no enredo, uso correto da voz, das expressões faciais e
corporais.
3 Existe diferença entre ler e contar histórias?
Muito diferente. Quando se lê uma história para crianças,
trata-se do autor se comunicando com as crianças; o leitor
figura apenas como um termodinâmico imparcial. Quando
se conta uma história, quem se comunica é o contador.
Isso faz muita diferença. O contador pode dar ênfase às
partes que julga mais importantes perante a mensagem
que deseja transmitir; outro fator é que ele está validando
o conteúdo do autor. A criança entende que aquele que
conta, que sempre será alguém próximo, pais, avós e
professores, concorda com o conteúdo que está sendo
transmitindo. E por último, em relação à afeição, embora
ler para as crianças seja aconchegante e um ato de amor,
a contação é mais íntima, permite maior envolvimento
entre os participantes, que acontece com o olhar, os
gestos, e um desenrolar apropriado ao feedback que
os ouvintes estão dando.
4 Contar histórias é algo que se aprende?
Sem dúvida. Em minha opinião, tudo se aprende, basta
querer! O que está errado é se limitar ao fato de que
algumas habilidades são inatas e ponto. Se tem, bom;
se não tem, que pena! Contar histórias se aprende e há
muito que se aprender, pois o contador de histórias é
um ator, com nuanças de atuação diferentes, pois um ator,
na maioria das vezes,
contracena com outros atores e dessa forma vai compondo
o entendimento. Mas o contador atua sozinho e dessa forma
tem que suscitar todas as emoções. Pensando no contador
educador, a responsabilidade é maior, pois ele deve escolher
as formas corretas de passar a mensagem educacional e, ao
mesmo tempo, encantar... Como o ator, o contador deve
escolher as palavras corretas, a cadência de narração dos
fatos com o timing adequado, para prender a atenção das
crianças, o uso correto de entonação, volume e velocidade
da voz e as expressões faciais e corporais. A narração de
histórias pode ser acompanhada de recursos auxiliares,
como o uso de fantoches, bocões, marionetes, o que
também irá necessitar de aprendizado.
5 Como estimular a leitura entre alunos de idades diferentes?
Responder a essa pergunta não é fácil, pois creio que
muitos editores, como também os professores,
principalmente os universitários, estão procurando essa
resposta. Os jovens nos dias de hoje leem muito pouco,
infelizmente. Esse fenômeno que já era marcante em
nosso país se intensificou com a internet. Não que ela
seja ruim, longe disso; pelo contrário, a internet é uma
forma de os jovens obterem mais informações. Mas o
que acontece é a rapidez com que essas informações
são obtidas, e a sua profusão gera uma impaciência em
todos nós; queremos saber de tudo e rapidamente!
Assim, ler um livro, para quem nasceu na era digital,
torna-se quase um suplício... Eu acho que o estímulo
à leitura é uma atividade constante e incansável;
a contação de histórias e a prática da representação
estimulam a leitura. Não penso que exigir uma resenha
funcione; acredito em criar atividades interessantes
que cativem o jovem à participação e que tenham
como apoio um livro ou um trecho dele. Acredito que
o professor deva utilizar na sala de aula elementos
que façam parte do dia a dia das crianças e jovens de
hoje, como filmes, seriados, games, blogs, e procure
ligá-los à leitura. Não há necessidade de fazer com
que se leia um livro específico; há necessidade de
estimular a busca, a pesquisa, o discernimento entre
o que é de qualidade e o que não é; deixar que cada
um siga o caminho que lhe interesse, que o envolva
e o encante. A nós, educadores, não cabe mandar,
talvez até, com exagero de retórica, nem se falar em
estimular, mas apenas em apontar... para deixar que
o mundo mágico dos diversos conhecimentos o cative!
Fundação Observatório do Livro e da Leitura
Nenhum comentário:
Postar um comentário